Por que eu estudo História?



"Pai, por que eu preciso estudar história?" perguntou meu filho certa vez quando eu estava explicando sobre a Primeira Guerra Mundial.

Eu olhei para ele, surpreso e divertido. A alguns anos atrás eu me fazia a mesma pergunta e tal pergunta me perseguiu por anos até ser respondida pela melhor professora que ja tive.

Era uma manhã chuvosa, o segundo dia de aula no ano, uma terça-feira, na primeira aula. Eu e meus amigos estávamos conversando sobre a festa que iríamos naquela noite, os quatro alvoroçados pela quantidade de música ruim, garotas e bebida que teríamos a nossa disposição. A nova professora de história entrou sem fazer alarde, como o sol se erguendo silenciosamente durante o amanhecer. Ela caminhou até a mesa, onde colocou e organizou seu material sem pressa. Naquele ponto, todos os alunos já tinham se recolhido para suas carteiras.

"Bom dia" desejou e murmúrios a responderam. Havia um giz em sua mão e ela desenhou as palavras com muita lentidão e cuidado, escrevendo na lousa a seguinte pergunta:

Por que estudamos História?

 "Eu posso apostar o meu salário que muitos de vocês se perguntam isso" ela disse com um sorrio começando a nascer em seu rosto "e ainda mais de vocês não sabem a resposta para essa pergunta. Então, o que vocês acham? Por que estudamos história?"

A sala estava mergulhada em um mar de silêncio, todos em um estado de nervosismo extremo por medo de ter de inventar alguma besteira para responder, mas a professora, que não nos disse seu nome ou mostrou-nos o que deveríamos esperar dela, não apontou para alunos e os mandou responder. Ela apenas esperou por alguns segundo e recomeçou a falar:

"Por que precisamos saber sobre a política do pão e circo na Roma Antiga? Por que precisamos saber sobre a Revolução Industrial e a criação de direitos trabalhistas? Por que estudamos sobre o sufrágio?" a cada pergunta, mais silêncio a respondia e ela não parecia abalada com aquilo "por que aprendemos sobre o nazismo? O que isso tem a ver conosco?"

"Isso... afeta o presente?" Mariah, uma das alunas mais inteligentes da sala tentou responder, mas estava se sentindo intimidada: a nova professora de história tinha uma aura de inteligência natural. Ela encarou Mariah por um tempo em silêncio e, afinal, disse:

"História não afeta o presente... ela é o presente" ficou em silêncio por alguns minutos "para entender história é preciso muito mais que ler meia dúzia de palavras sobre gente morta. Para entender história é fundamental que entendamos o ser humanos e como ele pensa. Se eu dissesse a vocês que meu nome é Cláudia, vocês acreditariam?"

Todos se entreolharam, confusos. Aquela professora era doida, pensavam, sem dúvida. Aquelas trocas de olhares só a fizeram sorrir mais.

"Sim, vocês acreditariam, porque não têm a mínima ideia de quem eu sou. Vocês não me conhecem, logo aceitam qualquer informação sobre mim como uma verdade. Há mil anos, os cruzados não sabiam o que Jesus pregava, por isso aceitavam as palavras dos sacerdotes cristãos que os mandavam para morrer nas Cruzadas. Novamente quinhentos anos atrás, o povo não conhecia a ciência na época da Inquisição, por isso aceitavam quando os sacerdotes falavam que ciência era bruxaria e queimavam nossos cientistas. Avançando mais um pouco, oitenta anos atrás os alemães não sabiam que o problema econômico que assolava seu país era culpa da Guerra que eles mesmos decidiram travar e quando Hitler disse que os culpados eram os judeus, eles acreditaram, porque era o que havia para acreditar. Do mesmo modo hoje, por que as pessoas acham que a ditadura foi algo bom? Por que na época da ditadura, os avós e pais dessas pessoas não sabiam das atrocidades que eram cometidas pelo próprio governo e, quando tudo foi a público por causa da democracia, eles foram induzidos a pensar que aquele era um problema da democracia, não do Regime Militar, logo defendem porque não sabem. E esse é motivo pelo qual estudamos História"

Ela se virou e escreveu na lousa: PADRÕES. Olhando em volta, era possível ver os meus amigos vidrados e embasbacados, muito poucos deles parecia não dar atenção ao que ela falava.

"A maior maldição da humanidade é a repetição de sua história" disse a nova professora com um sorriso cansado "Todos os acontecimentos que eu citei começam, acontecem e terminam essencialmente do mesmo jeito, apenas em situações diferentes. A história sempre se repete e é importante que a conheçamos, pois desse modo podemos evitá-lo ou estar preparados para quando ele chegar"

"Mas então é isso?" eu perguntei, indignado com aquela conclusão "a humanidade simplesmente está fadada a repetir acontecimentos de novo e de novo sem parar?"

"Nós evoluímos em três mil anos, não é?" ela perguntou sorrindo, divertida com meu ultraje "socialmente, nós evoluímos. Há cem anos, mulheres não podiam votar, há sessenta anos os Estados Unidos acabaram com a segregação racial. Talvez, com o tempo, possamos chegar a um patamar de evolução em que não precisaremos mais repetir a história em um loop infinito de acontecimentos. Mas não durante nossa geração. Nem durante a próxima. Nem a geração depois dessa. Então o máximo que podemos fazer é tentar garantir que não ocorram outras atrocidades como antigamente. É nossa responsabilidade entender como esses acontecimentos se passaram e espelhá-los no presente, para que saibamos como nos proteger. Dito isso, meu nome é Analu e eu sou sua nova professora de história."

Lembrando-me disso, olhei para o meu filho e perguntei:

"Por que precisamos saber sobre a política do pão e circo na Roma Antiga?"

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